sábado, 4 de junho de 2011

Leminski

       Sete de junho de 1989, dia da morte de Paulo Leminski. Morreu aos 44 anos, pouco mais de 32 depois de ter aparecido – em março de 1957 – no Colégio Paranaense, dos irmãos maristas, um dos mais tradicionais de Curitiba, onde eu estava desde 55. Ambos na segunda série do ginásio, ficamos em turmas diferentes.
Leminski tornou-se logo popular, não só porque, de físico avantajado, gostava de lutar, se não me engano, boxe, mas sobretudo porque tinha lido muito mais que todos nós, sabia latim a ponto de discutir com os professores e, de quebra, não se saía mal em grego.
Na volta das férias de julho, correu que ele descobrira sua vocação religiosa: no ano seguinte, iniciaria a formação de beneditino em São Paulo. Os mais chegados o cercaram no recreio e ouviram não apenas a confirmação da notícia, mas minuciosa explanação sobre as rígidas normas seguidas pelos monges, sem qualquer alteração desde São Bento. Da voz e do olhar de Leminski brotava a força dos escolhidos.
Até o fim das aulas, em dezembro, sua ida para o mosteiro foi assunto. No começo lhe perguntávamos se era para valer, depois incorporamos a idéia. “É o desejo de Deus”, diziam os professores; e os alunos que tinham fé repetiam a frase.
Em 58, Leminski em São Paulo, quase não se falou nele. Terminado o período letivo, vou eu um dia pela Rua 15 de Novembro (mais tarde, Rua das Flores), numa esquina esbarro em três ou quatro caras barulhentos, todos de cabeça raspada a zero e calça de brim coringa (antepassada da jeans). Bem como mandava a moda jovem, pelo menos em Curitiba. Um deles abriu os braços, gritou meu nome. Atônito, o abracei.
- Paulo Leminski!
Ele engatou uma risada gutural, sua nova marca registrada.
- Solto no mundo.
- E os beneditinos?
- Eles lá, eu aqui. Acordar às quatro da madrugada não é comigo.
Voltou para o Colégio Paranaense e agora, 1959, quarta série ginasial, fomos colegas de turma e de diretoria do Grêmio Literário Rui Barbosa. Não me lembro se Leminski desacreditara de Deus, mas da religiosidade antiga não havia vestígios.
Em 60, primeiro ano do Científico, eu cursei a Turma A, ele a B. Em 61, coincidiu de trocarmos o Colégio Paranaense pelo Colégio Estadual do Paraná. Nesse ano e no seguinte, convivemos bastante. Falávamos de literatura (muito) e dos maristas (mal). Às vezes eu passava em sua casa e íamos ver o movimento na Rua 15. Ele sempre levava um livro, de preferência a capa combinando com a roupa. “Para impressionar”, dizia. Ríamos desse seu recurso. Aliás, ríamos de tudo.
Em 63 vim fazer jornalismo no Rio e, durante anos, não ouvi falar em Leminski. No início dos 70, chefiava a reportagem numa revista dos Bloch, num fim de expediente Carlos Heitor Cony, então editor de Ele-Ela, me perguntou se eu tinha algum trabalho para oferecer a um rapaz de Curitiba, poeta e escritor talentoso, recém-chegado ao Rio.
Leminski havia emagrecido, demais até, e cultivava um bigode de pontas caídas, à oriental. “O Rio corroi, sou polaco curitibano”, me disse num domingo de almoço e cerveja em minha casa. Conversamos sobre a vida e o casamento, a poesia e o seu Catatau, praticamente pronto, a Igreja e os maristas (para variar, baixamos o porrete), a maconha e o ácido - as drogas da época. De tudo que dissemos, me impressionou o desejo de Leminski de não envelhecer. Citou Janis Joplin, “não quero acabar na cadeira de balanço da vovó”.
O polaco curitibano não se demorou por aqui. Voltou para o sul e de lá deu seu voo literário. Não o vi mais. No fim da década de 80, noite de plantão no Jornal do Brasil, atendi o telefonema de uma colega de São Paulo: “Ainda dá pra mexer no obituário?” Morreu um grande amigo meu, talvez você já tenha ouvido falar nele.”
Fiquei pensando nas coincidências da vida. Anos depois, de passagem por Curitiba, soube que a Prefeitura dera a um novo local de shows ao ar livre, onde existira uma pedreira, o nome de Pedreira Paulo Leminski.
Homenagem perfeita. Leminski não era praça, rua ou avenida. Era diferente.

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Comemoração - Amanhã, dia 5, fará três meses que me operei. A cirurgia e a internação inspiraram o texto inaugural do Brava Palavra, “A próstata, essa porcaria”, postado a 4 de abril. Três meses da cirurgia (fim do período de luz amarela), dois do blog, neste fim de semana vou tomar guaraná com pizza. 

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PROSEMAS
(Os Prosemas podem até parecer poesia, mas não são.
São apenas exercícios de escrita. Nada mais que exercícios de escrita)


Tempo
Outono inverno primavera verão.
Desfolhado abrigado florido desnudo
O tédio de esperar.
 (março/87)

Cegos
E os pessimistas insistem que o homem
Não deu certo.
Esquecidos, certamente, de que já se inventou
o olho de vidro.
(abril/87)

A dois
À mulher cabe
fingir o orgasmo.
Ao homem, fingir
que não percebe
o fingimento dela.
(novembro/07)

35 comentários:

  1. Fotografadíssimo Magay. Não me recordo se já ouvi falar nesse Leminski, mas gostei da crônica. Agora, o que interessa é o seguinte: o guaraná que você bebe é destilado ou fermentado?
    Outra coisa: achei delicioso o prosema "A dois". Obra-prima. A mulherada se considera cada vez mais esperta e na verdade ainda sabe muito pouco da vida.
    Abraço do seu Igor Matoni.

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  2. Igor adivinhão, neste fim de semana estou bebendo guaraná destilado, 12 anos. Que tal?
    E fico feliz por você ter gostado do "A dois". Modéstia à parte, também adoro.

    Antes que eu esqueça: uma colega de trabalho, nascida em Porto Alegre, me disse que o gaúcho só usa o você, no lugar do tu, quando quer dar um tom pejorativo à fala. É assim que você nos trata, pejorativamente?

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  3. Teresa, direto da serra de MPereira4 de junho de 2011 às 15:18

    Aqui do friozinho gelado da serra ... só conhecia o nome de Leminski ligado à MPB. Fui procurar seus poemas, MA RA VI LHO SOS !! Para coroar seus textos vc devia ter citado algum.
    Essa é pra ti, Igor. O "a dois" não reflete a verdade. Somos dissimuladas por natureza, um mecanismo de defesa nosso. Isso quer dizer que sabemos enganar qdo queremos.
    Pizza com guaraná, ECA ! ninguém merece, mesmo que seja 12 anos.

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  4. Magay (sem superlativo), não seja injusto comigo, eu tenho você e os outros (quase todos) que escrevem no BP em alta conta, jamais trataria vocês de modo pejorativo. Como eu disse no início, moro em São Paulo, capital, há mais de 30 anos e cheguei aqui no comecinho da adolescência. Fui deixando de ser gaúcho, hoje sou muito mais paulista-paulistano. Por isso uso "você" e não "tu". E nunca montei a cavalo e não tomo chimarrão faz um tempão. Nem sei por que eu disse que sou gaúcho, não dê importância a isso. Não me queira mal.
    Pra você, Teresa: quando não enganam, as mulheres ganham os homens muito mais profundamente.

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  5. Eu disse "qdo queremos", Igor. Não é sempre ...

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  6. Esse Igor... Além de misógino, é um gaúcho de meia tigela, vai ver que nem gaúcho é. Argh...
    Igor, na certa você não sabe o que é misógino, ou seja, não sabe nem o que você é. Consulte o Aurélio.
    Ana Gam.

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  7. Que inveja, Magay, você foi amigo do Paulo Leminski. Eu tenho o livro "La vie en close" e conheço bem mais da obra dele. Nossa, você não imagina a minha emoção quando li a tua crônica sobre os encontros de vocês dois. E a foto? Antigona, com as margens em branco, picotadas. Você dá a impressão de um menino tímido, você era tímido?
    Beijo do Cosme.
    Mais tarde o Leandro, meu namorado, vem pra cá e eu vou reler com ele o livro do Liminski.

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  8. Sim, Cosme, eu era tímido. Depois, trabalhando como jornalista, me soltei. Mas, dependendo da situação, a timidez volta.
    Boa leitura com o Leandro. Abraço.

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  9. Ana Gam, com que direito duvidas de minha condição de gaúcho e dizes para eu consultar o Aurélio? Vai ver, tu és mais ignorante que eu. Já te mandei para aquele lugar mal cheiroso e tu não foste? Larga do meu pé e vai. Te sentirás em casa. Grossa, recalcada. Aposto que és feia e rejeitada pelos homens que desejas. Azar o teu. Eu sou mais eu, eu por nascimento gaúcho de Cruz Alta e por adoção paulista da capital, paulistano, as mulheres não me rejeitam, elas me querem.
    Magay, um abraço noturno do Igor Matoni. Bom sono.

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  10. Tio, aqui é a Luisa, amiga da Tonha!
    Por uma incrivel coincidência li uns poemas do Leminski hoje. Adorei a cronica! Já é sabido por todos que voce é um ótimo escritor!
    Adorei o prosema "tempo" tambem.
    Muito bom!
    Continue escrevendo! É um exercicio lindo e que desperta muita admiraçao!
    mil beijos saudosos,
    Lu!

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  11. Luisa, que bom ler um comentário seu. Os comentários dos amigos da Antonia me emocionam. Eu continuarei escrevendo, sim, e você pode continuar a ler o blog. Mil beijos para você também.

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  12. Igor, és bobo demais. A partir de agora vou fazer de conta que tu não existes.
    Aviso da Ana Gam.

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  13. Aqui é a Anita. Demorei mas voltei. Não conhecia nada sobre Leminski mas fui pesquisar no google. O cara andava em todas. Poeta, pensador, compositor. É sempre bom saber de tudo e achei legal você nos apresentar a ele. É o que pretendo encontrar aqui, coisas novas. para aprender sempre. Eu detesto discussões a não ser que elas tenham algum motivo. Por que será que a minha quase xará tem tanta birra assim com o gaúcho ???
    beijo a todos vocês. Amanhã acordo cedo.

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  14. Combinado, Ana Gam. Eu não existo para ti e tu não existes para mim. Empatamos.
    Palavra de Igor Matoni.

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  15. Homenagem perfeita

    Parabéns pelo texto. Dessa vez, mais rico em linguagens: uma bela foto inaugurando a primeira crônica de junho. Gramaticalmente perfeita e coloridíssima de sentidos.
    Leminsk,assim como você, é rocha, tem olhar certeiro, antenas. DNA dos bons é assim. Gostei mesmo. Espero que seu "olho de vidro" fique verde ad aeternum. Verdesperança, verdetirésias, verderocha, verdeverde. E que o amarelo reine apenas no "guaraná"!
    Baci,
    Elisa

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  16. Que bom que você voltou, Anita. Fique mais. E tente se livrar do "Anônimo", identifique-se melhor, nome-sobrenome etc. Você é de onde?

    Elisa, já tirou a burca?

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  17. Agora sim isso parece um blog de gente civilizada. Não entendo as pessoas que nem se conhecem e se odeiam assim do nada. Por quê a implicância da Ana com o Igor ? Vc não sabe o que está perdendo, Ana. Os gaúchos são homens com H maiusculo ! Inteligentes, sensíveis, educados.

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  18. Que é isso, Teresa, você está generalizando. Já tive três namorados gaúchos, um era assim assim, outro grosseiro até dizer chega e só um amoroso e delicado. Em resumo, tem gaúcho (e gaúcha) de todo tipo, como tem carioca, paranaense, paraense, pernambucano etc etc de todo tipo. Aliás, isso é o óbvio.
    Ana Gam, a capixaba.

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  19. Vc há de convir, Ana, que cada lugar tem sua característica própria, O paulista, da capital, é mais sofisticado, já o do interior é meio caipira, o carioca não leva as coisas muito a sério, vaidoso demais, pernambucano tem fama de cabra-macho e por aí vai. Só conheci um gaúcho e , repito, um bom exemplar da raça !

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  20. Mas faz um favorzinho ? Suma de vez !

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  21. Ana Gam, quer dizer que você é capixaba? E mora onde, em Vitória?

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  22. Não moro em Vitória ou em qualquer outra cidade do Espírito Santo, nem no Rio. Onde eu moro não interessa.
    Ana Gam.

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  23. Mas Ana, lá atrás você disse que morava em Ipanema e que teve o carro roubado no Leme. Qual é a verdade?

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  24. Ana Gam tem várias verdades, mora em Ipanema e não mora no Rio, ela não vai explicar como. O que conta é o que ela escreve, valem suas opiniões.
    Gostou da terceira pessoa?
    A Elisa se mandou mas eu fico.

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  25. Ótimo, fique. More onde quiser, em dois ou três lugares, mas fique.

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  26. Vc, MA, tem que entender que nem sempre o que as pessoas postam é a verdade. O que se diz serve só praquele momento. Eu , aqui, posso morar onde bem entender. Não cobre coerência. Esse espaço, sem rostos, propicia isso e é uma maneira que se tem de voar. Hoje, por ex., eu estou numa casinha lá no alto da serra. lareira acesa, curtindo o frio.

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  27. Eu entendo, Teresa, eu entendo. Mas não é por isso que vou sempre suprimir a pergunta que me ocorre. Às vezes sim, às vezes não, depende de um monte de razões, muitas inconscientes. Nesse caso, perguntei e a Ana Gam deu uma resposta interessante. Logo, valeu perguntar.

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  28. Vc achou a resposta interessante ??? Não vi nada demais. Acho-a confusa. Ela e a resposta. Mas vc pode tudo, MA. Vc é o senhor todo poderoso, o dono do blog. Pergunte.

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  29. Eu, o senhor todo poderoso? Rarrarrá. Se não fossem vocês, o blog não resistiria. Por isso fico triste quando alguém some.

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  30. Ninguém é insubstituivel. Se um sumir logo entra outro.

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  31. Modestíssimo Magay. No que me diz respeito, fique tranquilo. Meus sumiços não se prolongam, eu gosto dessa troca de impressões. Acredite, já encaro o BP quase como uma mania. Mais uma mania, o que vou fazer? Me rendo.
    Abraço derramado do Igor Matoni.

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  32. Senhor editor, entenda a diferença: eu não sumo, eu apareço pouco. Sou muito ocupada, faço o que posso. Mas gosto do BP, não exageradamente como o Igor, mas gosto. E de hoje em diante vou tentar aparecer mais.
    Beijo, Luzia.

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  33. Eu disse que não ia explicar a afirmação de que moro em Ipanema e não moro no Rio, mas como a Teresa me achou confusa eu explico: é fácil, eu vivo fisicamente em Ipanema e espiritualmente continuo em minha cidade natal, no Espírito Santo. Qual é a cidade? Não digo, vou imitar o Cosme Dantas, que não revelou em que cidade de Sergipe mora.
    Bem, já falei demais, banquei a boazinha, chega, o resto é segredo.
    Ana Gam, a capixaba discreta.

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