O invasor
Todo fim de noite, MC ia do jornal em que trabalhava para um bar no Leme, a dois quarteirões de onde morava. Sentava-se numa mesa de canto e começava a beber. Bebia de mais e comia de menos, o bastante para enganar o estômago. Lá pelas tantas, de porre, levantava-se e cantava “Noche de ronda” (Luna que se quiebra sobre La tiniebla de mi soledad...). Finda a canção, curvava-se em agradecimento aos aplausos chochos e, trôpego, ia embora.
Uma madrugada, ao abrir a porta da sala do apartamento, quase caiu fulminado. Pensou em gritar pela mulher, mas se lembrou que ela tinha ido dormir na casa da mãe, a velha, doente, pedira companhia. Reuniu todas as forças, que àquela altura eram mínimas, e voltou à portaria.
- João - falou engasgado, - tem um cavalo na minha sala.
O porteiro segurou o riso, bancou o conselheiro:
- Um cavalo? Ora, o senhor precisa maneirar, desculpe, mas ultimamente tem exagerado...
- João, não estou bêbado, o porre passou. Um cavalo está junto do sofá, ele invadiu minha sala.
- ...
- Um cavalo branco, o invasor é branco.
- Por favor...
- Por favor o escambau – MC perdeu a paciência. – Sobe comigo, você não pode me negar ajuda.
Tomado por súbita energia, prendeu o porteiro pelo pulso e o puxou até a porta do apartamento, no segundo andar.
- Olha lá, o que é aquilo?
João estupefato:
- Um ca..., um cav...
- De que cor, diga, de que cor.
- Bran... um ca...valo branco.
Fácil concluir o que acontecera: o animal, na certa procurando tufos de capim para matar a fome, tinha escorregado na encosta do morro que ficava nos fundos do prédio e, o janelão do apartamento de MC aberto, despencara para dentro da sala.
Por sorte, muita sorte, o prejuízo foi pequeno - meia dúzia de objetos de pouco valor quebrados – grande foi o trabalho dos bombeiros para pôr o quadrúpede para fora. E, daquele dia em diante, MC passou a ser mais conhecido na boemia como o jornalista do cavalo branco na sala do que como o pinguço que assassinava “Noche de ronda”.
Profissionais
Ainda era novo em jornal, uma noite, em torno das dez horas, encontrei no Centro da cidade FN, repórter já tarimbado, que eu conhecia de oi, tudo bem? As pautas do dia cumpridas, os dois à toa, ele me convidou para tomar um uísque. Aceitei de pronto, sair com FN, ótimo papo e colecionador de histórias saborosas, me acrescentaria experiência, bastava ser bom ouvinte.
Enveredamos para a Lapa e, assim, ele a emendar um caso no outro e eu a ouvi-lo com admiração, falando apenas o indispensável, pulamos de bar em bar, em cada bar uma ou duas doses. De repente percebi que amanhecia, a noite passara e nós passamos a noite bebendo e caminhando, varamos toda a Avenida Mem de Sá, estávamos na boca da Rua de Santana. Nos despedimos e eu peguei um táxi para casa. É bem possível que naquele dia eu não tenha ido trabalhar, estava em ruínas.
Anos depois, achando que ia fazer uma grande revelação, falei da minha aventura com FN a NS, também jornalista. Ele riu superior: “Você fez isso uma vez? Pois eu perdi a conta de quantas noites eu e o FN atravessamos a Lapa enchendo a cara.” Acendeu o cigarro, me deu um tapinha camarada na barriga: “Programa pra profissional, meu querido.”
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Ilíada
Por tudo que os gregos da antiguidade nos ensinaram - e continuam a nos ensinar -, os gregos de hoje, mergulhados no desastre financeiro, merecem mais que nossa solidariedade, merecem nosso carinho.
(De repente, um pensamento romântico: se eu fosse um desses empresários multinacionais, com grana até a estratosfera, tirava a Grécia do buraco. Em seguida, o pensamento cínico: ainda bem que não sou).
Gay, eu já li e você deve ter lido também que na Grécia antiga o sexo entre professor e aluno fazia parte da educação da juventude, isso é que era unir o útil ao agradável. Povo sábio.
ResponderExcluirAntes que a Teresoca me pergunte, vou bem cada dia melhor um pouquinho.
Beijo a todos.
pois é, já ia perguntar mesmo. Como vc sumiu eu fiquei pensando que estivesse aproveitando a primavera.??!!!!!
ResponderExcluirEsse povo grego é muito esperto mesmo ! Imagina se a moda pega ?
Magaysíssimo, já passei pra várias pessoas a incrível história do cavalo que despencou pra dentro do apartamento do jornalista teu conhecido, é hilariante.
ResponderExcluirCosme, com todo respeito, nem tudo que os gregos faziam é pra ser imitado.
Abraço do Igor Matoni.
prefiro acreditar no seu pensamento romântico e torço pra vc tirar a Grécia do buraco antes que ela se afunde e leve todos com ela.
ResponderExcluirSenhor editor, "Ilíada", que você usa como título da sua nota sobre os gregos, é um dos maiores livros da humanidade. Tem de ser lido e relido, quem não conhece está perdendo um tesouro incomensurável.
ResponderExcluirVisitante.
Você tem toda razão, Visitante. A Ilíada talvez seja o livro mais impressionante que eu já li. Maravilha das maravilhas. Aliás, você diz que é pra ser lido e relido, eu ando pensando em relê-lo.
ResponderExcluirPreciso ler tanta coisa ... conversando com um amigo ele me disse que a BIBLIA é genial. Cheia de metáforas e ensinamentos. Tipo livro de cabeceira mesmo, sem pretensões religiosas. Fiquei interessada.
ResponderExcluirMagay, qual o melhor, Ilíada ou Odisseia? Os dois são do Homero, não é isso?
ResponderExcluirvim aqui por indicação de uma amiga, frequentadora do seu blog, MAntonio. Eu e ela estávamos lembrando de como era tranquilo passear pelas rua da Lapa, tomar umas e outras caipirinhas pela Mem de Sá, comer um coelho já alta madrugada, bater papo com desconhecidos e voltar a pé, SIM, eu disse A PÉ, pela rua da Gloria, sem ninguém a nos importunar, sem medo algum. Eu morava ali e ela seguia mais adiante. Nem eu mesma acredito nisso. Dia seguinte cada uma ia pro seu trabalho, sem ressacas...
ResponderExcluirNa minha opinião, Luzia, a Ilíada dá de dez na Odisseia. Não que a Odisseia seja fraca, longe disso, é uma beleza, mas a Ilíada é monumental, como eu já disse, maravilha das maravilhas. Se na Odisseia, Homero é gênio, na Ilíada é deus.
ResponderExcluirAndar a pé de madrugada no Rio... outros tempos, Maria Helena, outros tempos.
Não só na literatura se pode perceber a genialidade do povo grego.
ResponderExcluirToda a arte grega é divina afinal, não é lá que moram os deuses?
Nem ARES, o deus grego da guerra, poderia imaginar que uma tragédia como a que está acontecendo fosse se abater sobre a Grécia. E, quem diria, nossa presidenta se oferecendo pra ajudar ! É o fim dos tempos, ou o começo de um novo tempo ?
ResponderExcluirTeresíssima, eu sigo o noticiário do jeito que dá porque trabalho paca mas pelo que sei estamos sim entrando numa nova era, com tudo se transformando. E isso, se não me engano, começou em setembro de 2001 com o atentado que derrubou as torres gêmeas de NY. O mundo está cada vez mais do avesso.
ResponderExcluirAbraço do analista político Igor Avelino Soares Matoni.
Minha amiga Teresa tem razão. Quem poderia imaginar essa reviravolta ? O Brasil pousando de protetor dos oprimidos ? Só espero que isso não venha a se refletir na nossa economia. Presidenta, vai com calma. Cuide primeiro dos seus.
ResponderExcluirOi Igor, não sei se isso é bom ou é ruim. Mas o fato é que as mudanças estão acontecendo rapidamente. Sinto ameaça vinda de todos os lados e não confio muito nesse excesso de confiança da nossa Presidente. Não sei onde ela se baseia pra ficar oferecendo ajuda. Menos, menos ...
ResponderExcluirMaria Helena, no comentário anterior esqueci de te dar as boas vindas. A Teresa tinha me falado de você e eu, além de gostar do que você escreveu, fiquei contente de o blog ganhar mais um frequentador. Fique à vontade, beijabraço.
ResponderExcluirMarco Antonio, eu gosto de passear pelos blogs de amigos e de amigos de amigos meus. Obrigada pelas suas boas vindas. A Teresa é amiga de longa data . Foi bom reencontrá-la depois de tanto tempo.Ela arrasava corações. Linda, inteligente. cheia de vida. Rimos muito de nossas aventuras por essa cidade. Amadurecemos sem perder a ternura.
ResponderExcluirTeresíssima, então você arrasava corações? Eu já imaginava isso e desconfio que continua a arrasar. É aquela velha historia, quando eu for ao Rio quero tomar um chope com você e o Magaysíssimo.
ResponderExcluirIgor, isso tudo é intriga da oposição. No bom sentido, lógico. Os bons amigos enxergam a gente de uma maneira toda especial. Arrasava mada. Era o frescor dos 20 anos que nos fazia querer tudo ao mesmo tempo como se o mundo fosse terminar naquele dia. Hoje sou mais seletiva, tenho menos pressa mas acho que estou no caminho certo. Tenho certeza do que eu quero e de quem eu amo.
ResponderExcluirVai ser muito bom bater um papo com você. A palavra agora é com o MA.
Igor Aveliníssimo, é claro que, quando você vier ao Rio, tomarei um chope com você e a nossa Teresa. Será um prazer conhecê-lo.
ResponderExcluirIgor e o Editor. Vai ser engraçado sentar na mesma mesa. Assunto não vai faltar.
ResponderExcluirMagaysíssimo, ontem ao dar as boas vindas pra nossa nova amiga Maria Helena você usou a palabra "beijabraço". Gostei, vou usar com a minha turma daqui de Sampa.
ResponderExcluirIgor Avelino Soares Matoni.
Vocês me incluirem assim na lista de amigas foi super legal. Gostei do astral do blog. Gosto de ser instigada e, quando voltar de uma viagem a Manaus, vejo vocês de novo. Faço lá um trabalho social com os ribeirinhos. Miséria enorme que merece um tempo de nós. Hoje posso me dar ao luxo, se isso pode se chamar luxo, de ajudar um pouco aos que precisam mais do que eu. Beijo a todos, especial para minha amiga Teresa. Quem sabe ela se anima de uma outra vez a nos acompanhar nesse projeto ?
ResponderExcluirVolto logo.
Boa viagem, Maria Helena. Invejo quem faz trabalho voluntário, seja de que tipo for. Já tentei fazer, mas as peças não fecharam. E atualmente não tenho tempo, mas um dia, quem sabe?
ResponderExcluirMarco, a gente já falou não sei onde que somos enfermeiros aqui em Santos. Trabalhamos em dois hospitais e ainda encontramos tempo para ajudar os moradores de uma favela. Não estou contando isso para me vangloriar, mas para dizer que esse tipo de trabalho dá uma prazer enorme.
ResponderExcluirEsdras e Carla mandam beijos.
“A morte é a melhor invenção da vida. é o agente da mudança. é o que afasta o velho para dar lugar ao novo. Lembrar que você vai morrer é a melhor maneira de evitar a armadilha de pensar que você tem algo a perder. Seu tempo é limitado. Tenha a coragem de seguir o que seu coração manda”. Steve Jobs.
ResponderExcluirNão há como deixar de prestar uma homenagem a esse gênio. Steve Jobs.
Editor, o comentário do Esdras Barreto corrobora o tópico "O bom egoísmo", de 17 de setembro, posto por você abaixo do texto "Elis".
ResponderExcluirVisitante.
Também lembrei dessa postagem e mantenho o meu pensamento. Não interessa se é ou não em interesse próprio se ele atende às duas partes. Isso é o que vale.
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