sábado, 30 de julho de 2011

E agosto chegou

Patinho, Rolha e Caruncho chegaram quase juntos ao colégio. Cumprimentaram-se ruidosamente e, como a maioria dos colegas, espremeram-se contra o paredão batido pelo sol fraco da manhã.
- Não aguento mais essa friagem – Caruncho meteu as luvas -, parece a Sibéria.
- Que férias – Patinho reclamou -, passei a maior parte do tempo embaixo do cobertor. Me esquentando e lendo, vocês já leram Jorge Amado?
- Prefiro Érico Veríssimo – Rolha, xenófobo. – Não gosto do Nordeste.
- Pior pra você. O Jorge tem cada cena! De derreter.
- E o Nordeste – Caruncho, viajado -, cada praia! Areia fininha e muita mulher. Todas moreninhas, nada a ver com essas branquelas daqui.
- Veja quem fala.
- Polaco desbotado. Parece albino.
- Por isso mesmo. Quando casar, vou pôr uma cor nas crianças.
- Já escolheu o marido?
Rolha e Patinho riram e se coçaram. Caruncho fez sinal de pego vocês na curva. Para espantar o frio, saltitaram e trocaram socos. De repente, sincronizados, como o Trio Irakitan, perguntaram cadê o Boca?
Caruncho: - Ele vai faltar já no primeiro dia de aula?
Patinho: - Assim, repete o ano.
Rolha: - Vai ser bem-feito.
Nem acabaram de falar, no alto da escadaria Boca, teatral, abriu os braços: - E agosto chegou/cuidem-se, mamíferos preguiçosos/a vida os matará.
Os três amigos o vaiaram.
- Fresco.
- Normalista.
- Mocinha.
Boca desceu os degraus aos pulos, atirou-se no meio dos cúmplices.
- Insensíveis, idiotas.
Nesse exato momento, Irmão Telmo passou por eles. Arreganhou seu riso de ameaça, vocês não se largam, pois na minha aula vão sentar separados. O Quarteto fez uma reverência, o senhor, Boca disse, é nosso mestre, nosso guia.
O Irmão, já lá adiante, os rapazes se abraçaram.
Kim Novak. Monumento de sensualidade,
inspirava a juventude dos anos 50-60 na
prática da "justiça com as próprias mãos"
- E aí, Bocão, as férias?
- Sensacionais, estive no Rio de Janeiro.
- Carradas de mulheres?
- Milhões. E conheci uma prima, a cara da Kim Novak, vocês não têm ideia do que fizemos.
- Lá vem ele.
- O faroleiro.
- Tire a mão do bolso, deixe eu ver.
- Estão com inveja, não conto. Mudemos de assunto. Quem vence a eleição, Lott ou Jânio?
- Se eu tivesse idade de votar – Patinho, de família udenista – votaria no Jânio. Mas, mesmo sem meu voto, ele vai se eleger. É o próximo presidente da República.
- Que nada – Caruncho, pessedista de berço – o Lott ganhou uma espada de ouro.
Rolha, convicto: - Qualquer que seja o resultado, é tempo perdido. O Brasil só toma jeito no dia em que restaurarem a monarquia.
Boca, superior:- Pra mim, política é mistério. Entendo de poesia e de mulher.
Patinho esfregou as mãos: - Por falar em mulher, vamos ao sábado-dançante do Curitibano? Caminhões de brotos.
Boca não podia. Sábado, sua mãe fazia 40 anos e o dia seria de festa na família.
- Quarenta anos? – Patinho arregalou os olhos. – E ela vai comemorar?
- Velho – Caruncho balançou a cabeça – tem cada uma!  
Os quatro afundaram sob arrobas de silêncio. O sino chamando para a primeira aula do segundo semestre os deprimiu mais ainda.
(Continua)

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Beleza, beleza – Fã do futebol de qualidade, muito mais do que torcedor do Botafogo, continuo – como milhões de brasileiros - boquiaberto com o jogo de quarta-feira entre Flamengo e Santos. Habituado a me deitar por volta das 11 horas, há tempos vejo apenas o primeiro tempo das partidas noturnas que, por acerto da TV Globo com a CBF, começam pouco antes das 10. Pois no dia 27 abri uma exceção. Os 45 minutos iniciais, fechados em 3 a 3, tinham sido tão bons que adiei a ida para a cama. E valeu a pena. A vitória do Fla (5 a 4) foi o de menos, o Santos poderia ter vencido. O de mais foi o espetáculo e, em particular, a exibição de Neymar, autor de um gol celestial. Não resta qualquer dúvida, esse garoto é da família de Pelé, quase tão gênio quanto o divino Crioulo (atenção, eu disse quase).          

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Delícia - Pesquisa do Ibope mostra que 76% dos moradores do Rio se orgulham da cidade. Não gosto dessa história de orgulho, de modo geral acho bobagem, mas a verdade é que o Rio, com todos os seus problemas, é uma delícia.  O prazer de morar aqui às vezes alcança intensidade sexual. Exagero? Sei lá, se for, salve o exagero.  

30 comentários:

  1. Eu e o Leandro não conhecemos o Rio e faz algum tempo estamos planejando passar umas férias aí. Agora com o Gay dizendo que morar na Cidade Maravilhosa é um prazer com intensidade sexual nossa vontade de ir aumenta.
    Beijo a todos.

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  2. Ah! As memórias... Ao ler seu texto cheguei a ouvir "Moonglow" trilha sonora do filme Picnic estrelado pela bela Kim Novak e Willian Holden.
    Que força tem a arte!
    É capaz de acordar uma verdadeira orquestra dentro de nós.
    (Aguardo a continuação)

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  3. Magaysíssimo, o teu texto sobre os adolescentes que voltam ao colégio fala de um tempo que não foi o meu mas mesmo assim achei o máximo, é que no fundo os adolescentes de qualquer época se parecem, eles sempre se apaixonam por alguém como a Kim Novak. Aliás, eu gosto muito de Um corpo que cai, filme com ela.
    Quanto ao Flamengo e Santos, eu tinha pensado em te enviar um comentário e na correria acabei esquecendo. Que jogo, amigo. Como corintiano, senti inveja.
    Pra terminar: o Cosme diz que como morar no Rio dá um prazer parecido como o prazer sexual, ele agora vai mesmo passear aí com o namorado, pois eu vou mais fundo, vou ficar de olho num concurso pra passar a trabalhar e morar aí, ha-ha-há.

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  4. Magaysíssimo, um acréscimo ao meu comentário: eu não conhecia a expressão "fazer justiça com as próprias mãos" no sentido que você deu na legenda da foto da Kim Novak. Achei ótimo, ri muito.
    Abraço do Igor Matoni.

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  5. "A Maldição do Espelho", com Kim Novak, Rock Hudson, Tony Curtis e outros mais. Não sei porque me lembrei dele agora.Adorei esse filme.

    Agosto chegou me deu uma nostalgia imensa. Tempo em que eu voltava das férias e subia a serra pro internato. Bem verdade que eu, de birra, quis ir mas achava que não iam me deixar 10 longos anos. Reconheci em Patinho a Mariana, Caruncho a Tanit e em Rolha minha amiga querida Helen.

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  6. Me lembrei com saudade dos meus tempos de colégio. Valeu.
    Visitante.

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  7. Carol Vinhas de Jesus31 de julho de 2011 às 13:07

    Depois de ler o novo texto do blog, perguntei ao meu pai sobre a Kim Novak e ele se entusiasmou tanto que quase babou. Ela devia mesmo ser uma mulher e tanto.

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  8. Pois Jânio ganhou, o Flamengo ganhou (vivaaaa mengaaaaao!!!!), e o Rio de Janeiro é sim uma delícia. Nao vejo a hora de volta e dar um mergulho em Ipanema... ir a uma roda de choro na Lapa!

    saudade!
    beijoca da Bolívia


    ps: Neymar fez um pra entrar pra história, mas ainda tem que comer muito feijao com arroz pra alcancar Pelé... nem assim!

    e, quanto ao jogo, já vi e revi os melhores momentos umas 7 vezes... jogaaaco...vamos ganhar este campeonato... viu o Felipe defendendo openalti e saindo de embaixadinha?? hahaha, grande Flamengo!!!

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  9. Magaysíssimo, que legal receber comentário da filha a partir da Bolívia. Ela está de férias lá?

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  10. Está, Igor. Ela de férias lá e eu cheio de preocupação aqui. Sabe como é pai e mãe, e eu sou pai tardio o que aguça a preocupação. Por outro lado, fico contente, muito contente, por ela estar se jogando no mundo. Diferenças à parte, como eu, justo na idade que ela tem hoje, 19 anos, me joguei ao vir de Curitiba para o Rio, fazer a vida aqui. Deixei meus pais preocupadíssimos, velhos bobões. Como eu, hoje. Fazer o quê?

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  11. Marco, a gente é mãe e pai e a gente te entende, filho é fogo mas um fogo bom.
    Beijo da Carla e do Esdras.

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  12. Depois que os filhos nascem tudo se transforma definitivamente. Não há mais sossego, ninguém é feliz completamente se eles também não são. Não existe hora certa pra soltá-los no mundo. Cada um tem seu tempo. Mas tem a contrapartida de uma alegria imensa de vê-los crescer, de conversarem de igual pra igual, de terem opinião própria. É o ciclo da vida, MA.

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  13. Eu e o Leandro pretendemos adotar uma criança daqui um tempo. Quando penso nisso lembro os versos de Vinicius de Moraes: Filhos? Melhor não te-los mas se não os temos como sabe-los? Lindo, não é?
    Beijo a todos.

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  14. Pois eu não tenho filho e não quero ter. Quero a vida mais livre.
    Visitante.

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  15. Mais livre ou mais vazia?

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  16. Uma vez também pensei que seria melhor não ter filhos. Mas, de todas as amigas fui a primeira a tê-los. Depois veio aquele peso de cuidar sozinha de dois bebês. Olhava pra eles e achava que não ia conseguir. Tinha 20 anos e toda aquela ânsia de viver atropelando a vida. Mas o tempo é sábio e, depois de muito apanhar, estou aqui inteira e feliz.

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  17. Bobagem, Carla Barreto. Tenho a vida bem preenchida, muito bem preenchida.
    Visitante.

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  18. Mudando de assunto, essa é pra vc, MA. Não acho legal essa sua colocação que compara viver no Rio como quase um prazer sexual. Será que ele desperta esse tipo de desejo ? Isso é mais propaganda pra turista que vem atraído pelas supostas facilidades que homens e mulheres oferecem. Nós, cariocas, vamos muito além disso. Quando estou longe eu me lembro do Rio de outra maneira. Das pedaladas em volta da Lagoa, de sentar num banco da praia e olhar o mar, do chope com amigos em qualquer boteco, das empadinhas da Salete, das manhãs na feira da Lavradio, do por do sol do Bira em Guaratiba. Ah, isso sim, quem não conhece não sabe o que está perdendo.É pura magia poder sentar ali na varanda, caipirinha na mão, música de primeira, camarão torradinho com farofa de alho e muita conversa jogada fora até o sol cair. Esse é o exagero que o Rio oferece.

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  19. Teresa, eu falei em prazer sexual no sentido freudiano, abrangendo tudo que dá prazer físico (e, no embalo, também prazer espiritual), como pedalar, olhar o mar e tudo o mais que você enumera. Ou seja: ao dizer que viver no Rio tem a ver com prazer sexual não me restringi ao gozo genital ou carnal. Seria uma afirmação muito pobre.

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  20. Tudo bem. Tá explicado.

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  21. santa periquita ! eu também entendi, Tereza, o que você quis dizer mas as cidades litorâneas que vivem assim como a nossa, banhadas em sol, sugerem, SUGEREM coisas além do que se vê. Existe sim no ar uma áurea de sexualidade, normal e saudável.
    VIVA O RIO !

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  22. Se for sensualidade eu concordo. A propósito, meu nome é com S, tá ? e o seu ? Não tem porque se esconder assim.

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  23. prefiro o anonimato. Vocês se expõem muito mesmo dando nomes ficticios. Um dia eu apareço e ponho até foto. Entendeu Teresa, com S ????? qual a importância de uma pequena letra a mais ou a menos ???? mas se vai se sentir melhor com isso, lá vai ela, TERESA !!!!!!!!!!!!!!!! Segura o S aí !

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  24. Não posso pôr a mão no fogo por todos, mas os comentaristas que conheço pessoalmente não usam nome fictício.
    Também pode ocorrer, claro, que eu conheça quem prefere o anonimato. Aí as razões dessa escolha são muito particulares e eu não tenho como mudar a situação.

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  25. Mas vc há de convir que não existe coisa pior do que falar pra quem não se apresenta. Além de ser extremamente deselegante por parte de quem se diz anônimo.

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  26. Pois é, Editor, nós nos conhecemos e eu não me identifico, não por deselegância, como diz a Teresa, mas porque nas vezes em que estivemos juntos não nos demos muito bem. Acontece que, apesar disso, eu gosto do teu blog.
    Visitante.

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  27. Magaysíssimo. Meu nome verdadeiro, nada de ficticio, é Igor Avelino Soares Matoni. Mas pode me chamar de Igor Matoni.
    Abraço.

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  28. Igor, eu sempre invejei quem tem pelo menos quatro nomes porque pode ser pelo menos quatro pessoas. Você, por exemplo: Igor Matoni, Avelino Soares, Igor Soares e Avelino Matoni. Pode ainda: Igor Avelino ou Avelino Igor e Soares Matoni ou Matoni Soares. Em caso de necessidade, fugindo da polícia ou em outra situação embaraçosa, é a mão na roda.

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  29. Espertíssimo Magay, na minha época de jovem irresponsável, tive duas namoradas ao mesmo tempo, pra uma dei o nome de Avelino e pra outra de Igor. Foi maravilhoso.
    Abraço do Igor Matoni, hoje um jovem senhor cheio de responsabilidades.

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  30. não é preciso ter tanto nome e sobrenome pra ter várias namoradas. Mas vc me deu uma idéia. Tenho cinco nomes e daí ...

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